terça-feira, 21 de outubro de 2008

Acabrunhada

No momento, estou sem esperanças no meu país. Espero que seja uma sensação momentânea, algo passageiro, reflexo dos últimos acontecimentos. Estou assim desde que a minha pseudo-segurança pequeno burguesa foi colocada em xeque. Isso mesmo, entrei para os índices das vítimas da violência urbana e há nisso tudo diversas nuances. Há sentimentos, frustrações e incertezas. Por isso, desabafarei.

A noite do dia 11 de outubro de outubro pra mim foi meio adversa. Fui assaltada quando chegava em casa com meus pais. Estávamos no nosso prédio e um sujeito que apareceu do nada, apontou uma arma pra minha cabeça, engatilhou o revólver pra minha mãe, levou o meu carro, minha bolsa, meus documentos. Até aí “tudo bem”. São apenas perdas financeiras, mas houve também perdas afetivas e emocionais. Estava no carro um diário da minha mãe que tinha no mínimo 50 anos de existência. Lembro de alguns momentos encontrá-la lendo o que seu pai havia escrito. Era uma forma de torná-lo presente, vivo. Havia também dois vestidinhos meus da época em que era bebê. Eles eram lembranças para mostrar aos meus filhos, pois foram as minhas primeiras roupinhas. Já as perdas emocionais são algumas: uma sensação de insegurança, impotência,...

Na realidade, narrei este episódio para poder falar sobre a violência urbana e como ela esta sendo naturalizada entre nós. Duas coisas me vêm à cabeça: a minha experiência como repórter policial e o contador do pebodycount que vejo todos os dias. Como repórter, eu sempre tentava distanciar-me de alguma forma, uma coisa pra se proteger emocionalmente e tal. Na verdade as vidas e as dores, viravam personagens, noticias, histórias, leads... Se na época eu já achava tudo uma merda, agora distante temporalmente daquilo ali, aí é que me incomodo mesmo. Quanto ao PE Body Count, site feitos por uns colegas jornalistas e que tem um contador sobre os números da violência no estado, todo dia eu passavam em frente ao contador e via sem muito espanto os números de homicídios que sempre ultrapassavam uma dezena. O impressionante nas duas experiências é que as estatísticas e leituras jornalísticas e sociologizantes cediam lugar a algo que é muito maior. Algo que envolve subjetividades como comportamentos, escolhas, emoções, saúde...

Uma outra observação.O que mais ouço desde do dia do assalto é “graças a Deus estão todos bem” ou “podia ter acontecido algo pior”. Concordo com o principio das duas sentenças, no entanto, acho que quando colocamos as coisas desta forma estamos nos adaptando a uma situação inadaptável, algo que não pode ser visto de uma forma tão prosaica. Graças a Deus que eu saí ilesa sim, mas não posso sentir-me aliviada. E o discurso que evoco aqui não é o da materialistasinha ou da burguesinha que só pensa em grana e que despertou pra realidade social agora. Eu tou pensando que de repente o meu vizinho que mora na favela ao lado está gritando pra mim que não existe Estado, segurança pública e que eu vivo na terra de ninguém. Sim, pq uma semana depois do meu assalto, foi a vez da minha prima que estava chegando na casa da minha tia que mora uma rua depois da minha. Ela teve mais sorte, a gasolina do carro dela acabou e o automóvel foi encontrado; E o que é pior, ontem um senhor não sei de onde liga pra mim e diz que foi assaltado na minha rua, cerca de 100 metros da minha casa, e que o carro que foi utilizado para o assalto era o meu. J Parece piada né? Mas não é. Quando fui à delegacia fazer o B. O. encontrei uma delegacia caindo aos pedaços, não tinha cadeira pra sentar e um funcionário puto que amargamente dizia-me: no meu plantão de hoje, que ainda está na metade, o seu carro é o 15º automóvel roubado. Lembrando só que era uma delegacia de plantão de um bairro classe média. Sei não viu?


Diante deste quadro dantesco, lembrei de uns colegas do curso de francês que apesar da vida estabilizada aqui no Brasil, decidiram migrar para o Canadá em busca de um pouco mais de segurança e de um Estado eficiente. Não sei se pra mim a migração seria uma possibilidade viável. Eu acreditava tanto em tudo isso aqui.

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