quinta-feira, 20 de novembro de 2008

A causa de acessibilidade - parte I

Desde sempre achei que devemos nos engajar em alguma coisa, por diversos motivos: por sermos seres políticos, por vivermos num país pobrinho, por sermos privilegiados economicamente, por termos oportunidades, enfim... Então, quando vejo e encontro pessoas que fizeram da sua experiência pessoal uma causa coletiva acho maravilhoso.

Foi pensando assim e com o ímpeto de mudar o mundo, que só a adolescência nos proporciona, que envolvi-me num projeto bem bacana há oito, nove atrás. Era a época do meu vestibular e pela primeira vez na minha vida as coisas não tinham saído como eu esperava, ou seja, não passei no vestibular de Direito como pretendia. Diante do baque e com a ajuda da minha mãe, pensei o seguinte: se para mim que sempre estudei nos melhores colégios e sempre tive acesso aos melhores produtos da educação era difícil, imagine para quem vem de escola pública?

Foi naquele momento que pensei que a minha derrota (sim pq aos 17, 18 anos o seu grande sonho na vida é entrar na faculdade) poderia ser sublimada e proveitosa se eu a transformasse em algo bom para outras pessoas. Foi assim, que eu e uma amiga, que havia passado três anos no martírio das reprovações do vestibular, decidimos criar um cursinho pré-vestibular gratuito para os alunos de baixa renda (a maior parte era de escola pública e tinha renda familiar de um ou no max dois salários mínimos) do nosso bairro. Instalamos o cursinho no centro espírita que freqüentamos, chamamos nossos amigos para serem professores e em menos de um mês estávamos inscrevendo os nossos novos alunos. Eu dava aulas de Literatura. Havia uns 12 professores e uns 25 alunos. Rapidamente criamos um grupo tão coeso e fraterno que muitos daqueles alunos são meus amigos até hoje. Nós éramos jovens, burgueses e idealistas. Nunca havíamos dado aula de nada, mas tínhamos um envolvimento tão grande com o projeto que tenho certeza que a nossa imaturidade não influiu de forma nenhuma na qualidade do cursinho.

Como eu era a que morava mais perto do local, fui nomeada coordenadora do grupo. Fazia de tudo, ligava para os professores, tapava buracos, organizava as reuniões. Os nossos professores eram muito bons. Lembro de alguns que, impossibilitados de dar aulas durante a semana por causa da faculdade ou de outros compromissos, vinham dar aulas aos domingos, às 8h e o mais impressionante de tudo era que os professores deste dia moravam a 25 km do local, ou seja, cruzavam a cidade para chegar.

Foi durante aquelas aulas que descobri e confirmei a minha vocação para sala de aula e que em vez de Direito e Jornalismo, deveria fazer Letras e Jornalismo. Isso foi um dos maiores acertos da minha vida. Nas aulas eu também aprendia muito. Aprendia sobre o mundo vizinho ao meu, mas que era completamente desconhecido aprendia sobre tudo. Crescia demais. E eles nos agradeciam pela possibilidade de sonhar com uma universidade e diziam-nos que eles iriam multiplicar aquela experiência.

Hoje parte deles está se formando ou já estão formados. Passaram na Universidade Federal de Pernambuco, são biólogos, assistentes sociais, historiadores, pedagogos, contadores e artistas plásticos. Tenho orgulho de todos. E falo sobre isso pq sei que eu e aqueles professores fomos pequenos instrumentos diante da vitória que significou a profissionalização na vida deles e, sobretudo, que nosso ganho pessoal foi muito maior.

Talvez poucas pessoas imaginem a dimensão daquela época pra mim. Mas tudo ali, mudou definitivamente a minha existência.

P.S. 1: No ano da fundação do GEP (Grupo de Estudos Pestalozzi, que tinha tb como slogan: ampliando horizontes) eu passei em Letras e Jornalismo. Foi o ano que menos estudei na vida, pois dedicava-me integralmente ao GEP.

Nenhum comentário: